Após
a segunda guerra mundial, especificamente em 1947, as nações iniciaram as
negociações em prol da criação de uma Organização Internacional que regulasse o
comércio internacional. Realizou-se em Genebra uma reunião com o intuito de
criar a OIC (Organização Internacional do Comércio). A entidade objetivava
complementar o novo sistema econômico internacional, que já contava com o FMI
(Fundo Monetário Internacional) e o Banco Mundial, ambos criados em 1944. Com o
objetivo de dar seguimento à formação desse sistema, a OIC foi criada em 1948,
na cidade de Havana, envolvendo 53 países tratando de regras comerciais e
pautas desenvolvimentistas. Entretanto, a mencionada Organização foi
inviabilizada com a recusa dos EUA em ratificar o acordo (ROCHA, 2013).
Felizmente,
nem toda a negociação estava perdida, já que a partir daí surgiu o GATT 1947[1].
O acordo foi marcado por algumas rodadas de negociação, porém, sem definição
concreta de parâmetros para ampliar o fluxo de transferência de tecnologia do
Norte para o Sul ou um maior comprometimento daqueles países com o
desenvolvimento destes. Entretanto, com o passar dos anos, as relações
comerciais foram se aprimorando e ampliando o status do comércio internacional,
de modo que o GATT 1947 já não atendia às diversas necessidades dos países
membros (como a necessidade de um órgão para solução de controvérsias em
matéria comercial).
Para
solucionar tal problema, foi estabelecida em 1986, na cidade de Punta del
Leste, o conjunto de negociações conhecidas como Rodada Uruguai, finalizando em
1994 na cidade de Marraqueche, com a assinatura do Acordo constitutivo da OMC
pela maioria dos países participantes das negociações. A Rodada Uruguai teve
dez anos de duração e foi palco de embates entre os países do Norte e os do
Sul.
Os
países em desenvolvimento reivindicavam maior comprometimento de países
desenvolvidos através do incentivo da transferência de tecnologia e
investimentos diretos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) nas universidades
e empresas dos primeiros. Já o segundo grupo defendia a inclusão do tema
propriedade intelectual na OMC, com a definição de parâmetros severos de
proteção.
O
principal embate acerca do tema durante as negociações da OMC ocorreu
justamente quando se discutia a inclusão de um acordo sobre propriedade
intelectual no âmbito da organização. Durante o Governo de Ronald Reagan, quando
houve uma maior intensidade da noção de propriedade da tecnologia e da tutela
dos investimentos da indústria cultural. Os Estados Unidos iniciaram uma
ofensiva de caráter unilateral impondo sanções de várias naturezas aos países
que não aceitassem aos parâmetros impostos, abandonando o foro tradicional das
discussões de propriedade intelectual, a
OMPI[2]. Assim, foi lançado um processo de negociação
do tema no âmbito do GATT, através da Rodada Uruguai, que resultou no acordo
TRIPs da OMC (BARBOSA, 2018).
O
autor assegura ainda que a utilização inteligente e oportuna de alguns países
asiáticos através da imitação e do uso adaptativo ou da cópia servil mais
competente aumentou a visibilidade do problema da propriedade intelectual,
resultando na imposição de fortes barreiras à entrada de novos competidores.
Conforme
mencionado, o tema “propriedade intelectual” foi incluído no âmbito da OMC
através do Acordo TRIPS (Trade-Related Aspects of Intellectual Property
Rights), que define os parâmetros mínimos de proteção dos direitos de
propriedade intelectual, que devem ser incorporados às legislações nacionais
nos prazos determinados.
Chengsi
(1998)[3]
afirma que muitas nações buscaram incluir a proteção à PI nas negociações
comerciais internacionais motivados pelas distorções do comércio e da violação
dos Direitos de Propriedade Intelectual. Além disso, como o ingresso na OMC é
prioridade para quase todos os países em desenvolvimento, a vinculação do TRIPS
à admissão na organização eliminou grande parte da hesitação em aceitar as
normas internacionais de proteção à propriedade intelectual. Assim, o
cumprimento do acordo TRIPS tornou-se uma condição obrigatória para a entrada
de membros na OMC[4].
Ao
vincular a propriedade intelectual ao comércio internacional, a incapacidade dos
membros em cumprir os requisitos do TRIPS pode resultar em sanções comerciais
no âmbito da OMC, visto que o acordo estabelece um nível mínimo de proteção
aceitável pelo qual todas as nações membros devem respeitar. O temor às sanções
deve assegurar que este nível mínimo seja a proteção básica para todos os
estados membros[5].
Segundo
Luz (2015), o Acordo pode ser entendido através da definição de suas duas
principais regras:
Primeiro,
o compromisso assumido pelos países em estender aos direitos de propriedade
intelectual estrangeiros à proteção que já concediam aos direitos nacionais, sendo
criado o Princípio do Tratamento Nacional no art. 3º. No Brasil, por exemplo,
pela Lei nº 9.610/1998, o autor brasileiro possui o direito patrimonial sobre a
obra durante toda a sua vida, e a proteção continua por mais setenta anos,
contados a partir de 1º de janeiro do ano seguinte ao do seu falecimento. Pela
aplicação do acordo de TRIPS, esse mesmo prazo de proteção é concedido, no
território brasileiro, aos autores estrangeiros e seus herdeiros.
Segundo,
foram definidos níveis mínimos de proteção para cada direito de propriedade
intelectual. Por exemplo, no acordo consta que as patentes serão protegidas
por, pelo menos, vinte anos a contar da data do depósito. Para as marcas
definiu-se um prazo mínimo de sete anos. O autor acrescenta que a proteção para
as patentes nacionais é de dez anos e as estrangeiras por vinte anos.
Afirma-se
ainda que antes do TRIPS, já existiam acordos internacionais tratando de
direitos de propriedade intelectual, os quais não foram revogados, mas
expressamente confirmados por este. Cita-se como exemplo: a Convenção de Roma –
Convenção Internacional para Proteção aos Artistas Intérpretes ou Executantes,
aos Produtores de Fonogramas e aos Organismos de Radiodifusão – (1961), a
Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Intelectual (1967), a Convenção
de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (1971), e o Tratado
sobre a Propriedade Intelectual em Matéria de Circuitos Integrados (1989).
O
Acordo TRIPS aborda uma ampla gama de áreas de propriedade intelectual (como
direitos autorais, marca registrada e patente). Abrange igualmente os mercados
concorrenciais, as medidas de execução, a resolução de litígios e as
disposições transitórias[6].
[1]
General Agreement on Tariffs and Trade ou Acordo
Geral sobre Tarifas e Comércio, relativo às regras tarifárias e comerciais que
futuramente se transformaria na OMC (Organização Mundial do Comércio) com sede
em Genebra, na Suíça.
[2]
Orgnização Mundial de Propriedade Intelectual responsável pela atualização e
proposição de padrões internacionais de proteção às criações intelectuais em
âmbito mundial.
[3]
Zheng Chengsi, The TRIPS
Agreement and Intellectual Property Protection in China, 9 DUKE J. COMP. &
INT’L L. 219, 219 (1998).
[4] INTERNATIONAL INTELLECTUAL PROPERTY ANTHOLOGY 8-9 (Anthony D’Amato & Doris Estelle Long eds., Anderson
Publishing Co. 1996).
[5] Jean Raymond Homere, Intellectual Property Rights Can Help
Stimulate the Economic Development of Least Developed Countries, 27 COLUM. J.L.
& ARTS 277, 280-81 (2004).
[6] United Nations Conference on
Trade and Dev., Dispute Settlement, World Trade Organization, 3.14 TRIPS, at 20
(2003), available at http:// www.unctad.org/en/docs/edmmisc232add18_en.pdf
(prepared by Frederick M. Abbott, Florida State University Collge of Law, at
the request of the United Nations Conference on Trade and Development).